Antes de mais nada, há quem acredite que as inovações são fruto de um trabalho árduo de cientistas e pesquisadores. Com seus jalecos brancos, trancados em seus laboratórios trabalhando por horas e horas incansavelmente, a base de muito café e até mesmo dormindo no escritório por dias.
Um mito que é alimentado em muito pela indústria cinematográfica e uma geração que bebeu da fonte da revolução industrial. Fato é que, sim, precisamos de muitas horas de trabalho para termos uma inovação, porém, acredito que raramente é preciso ser desta forma desgastante e muitas vezes levando as pessoas ao seu limite físico e mental.
O primeiro ponto é que se fosse simplesmente preciso trabalhar muitas e muitas horas para que se tivesse uma inovação, os workaholics, seriam ricas e bem sucedidos, afinal, teriam o poder de criar muitas inovações e dominariam o mercado, mas sabemos que não é isso que acontece.
De antemão, este conceito diz que quando estamos em uma situação de estresse, prazos curtos ou mesmo focados em resolver um problema, tendemos a criar uma névoa mental, que não permite que enxerguemos muito além do que já sabemos e dificulta aceitarmos opiniões e informações contrárias ou novas.
Por exemplo, pesquisadores descobriram que o fluxo sanguíneo é reduzido no cérebro, quando sob ameaça, diminui a visão periférica significativamente, para que possamos lidar com o perigo imediato.
Contudo, foi observada uma redução substancial na visão periférica de atletas antes de uma competição. Enquanto visão de túnel ajuda atletas a terem foco, ela nos fecha para novas ideias e abordagens.
Descartado esse mito de que a única forma de se obter inovações e avanços significativos são através de horas, horas e mais horas de trabalho desgastante, voltamos ao nosso título.
A princípio, a palavra ócio é usada muitas vezes de forma pejorativa, mas em sua origem ela não traz esse estigma.
A palavra ócio vem do latim otium, que significa “inatividade”. Na tradição grega otium também pode ser utilizado para definir o momento de descanso e de trabalho intelectual. Inclusive essa palavra originou o verbete “negócio”, que significa, portanto, a negação do ócio. (1)
Justamente esta conotação da tradição grega que coloca o ócio como um momento de livre pensar e de trabalho intelectual.
Então, para sermos criativos precisamos de tempo livre, sem regras, sem hora certa para começar e acabar, tempo com outras pessoas, vendo e ouvindo outras coisas e os mais variados assuntos possíveis.
Dando continuidade, você com certeza já ouviu a história que diz que Issac Newton, descobriu ou formulou a lei da gravidade aos pés de uma macieira, após uma maçã cair em sua cabeça.
Há quem diga que é uma fábula, mas de fato existe um manuscrito antigo do físico William Stukeley: Memórias da vida de Newton. É a primeira descrição da experiência de Newton com a maçã mais famosa da ciência. Como citado no trecho: “Depois do jantar, fomos ao jardim e tomamos chá, sob a sombra de algumas macieiras. Ele me contou que estava antes na mesma situação quando a noção de gravidade veio à mente dele. Foi em decorrência da queda de uma maçã, e ele sentou-se contemplativamente. Por que deveria aquela maçã sempre cair perpendicularmente em direção ao solo, pensou ele” (2)
Fato é que a teoria nasceu da observação da natureza, possivelmente em um momento de descanso ou lazer. Foi ao observar o mundo ao seu redor que Newton viu a queda da maçã e seu cérebro fez conexões antes não imaginadas e dali em diante foram horas, talvez dias ou meses até a elaboração da tal lei.
Mas bem possivelmente tudo começou com um momento de ócio.
A teoria chamada de ócio criativo, foi criada pelo sociólogo italiano Domenico De Masi no fim do século XX, que fala:
De forma bem macro, ele diz, entre outras coisas, que a sociedade está se transformando, passando para uma fase de pós-revolução industrial, o que significa que a grande maioria das pessoas não precisa mais trabalhar horas e horas, que o trabalho braçal e/ou rotineiro está e cada vez mais será feito por tecnologia (robôs, inteligência artificial, etc).
O que nos cabe é concentrar no trabalho intelectual. Também alerta que é preciso equilíbrio, o corpo precisa alternar entre momentos de relaxamento e de trabalho para que possamos estar no nosso potencial máximo.
Em síntese, o resumo é: precisamos de equilíbrio!
Para ser criativo e conseguirmos gerar as inovações que desejamos é preciso ter um grande e variado repertório, para que nosso cérebro possa fazer novas conexões de elementos.
Para criarmos essa biblioteca de conhecimentos, que serão insumos para nossa criatividade, temos que alimentar nossa mente com todo tipo de ócio, desde leituras, passando pelo cinema, música, teatro, viagens, até mesmo o “não fazer nada”.
Estes momentos em que não temos pressa, nem hora, podem gerar poderosas conexões, que trarão ideias frescas e criativas, com potencial de virarem inovações.
Então, trabalhe arduamente, dê o seu melhor, mas organize seu tempo e sua rotina para momentos de lazer e descanso, se cobre menos pelas pausas e pelo cansaço e quando a culpa por ter relaxado um pouco bater, lembre-se que isso faz parte do processo de inovação!